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O silêncio começa a ter valor social





A audição sempre me pareceu ser o sentido humano mais maltratado. Particularmente nas grandes cidades, o aumento do barulho tem relação direta com a capacidade com que se expandem, tornando-se quase onipresente. Muito pouco se fez até hoje para abaixar o nível de ruídos nas cidades e, consequentemente, valorizar o silêncio, uma realidade que começa a mudar lentamente.


Não é de hoje que se conhecem os males da poluição sonora, considerada a segunda maior depois da poluição do ar, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Além de danificar a audição, pode causar estresse, aborrecimento, distúrbios do sono e efeitos sociais diversos, acima do limite recomendado de 50 decibéis (dB).

Mas, até agora, pouco se sabe sobre a atuação do silêncio. Recentemente, publicações portuguesas revelaram pesquisas que demonstram os seus efeitos benéficos para o cérebro humano. Segundo estudos realizados na Alemanha, há processos cerebrais que só podem ocorrer em silêncio e este pode ser até um fator que proporcione regeneração neurológica.

A ausência de estímulos auditivos teria quase a mesma função que o descanso, desestressando, facilitando a estruturação da informação e nos tornando mais inteligentes, criativos e seguros.

Não sei se foi o aumento do conhecimento sobre o tema que influenciou o cidadão-consumidor ou a ascensão dos carros elétricos no mercado internacional, o fato é que o silêncio dá sinais de começar a ser valorizado não somente nas cidades como na indústria.

Há cerca de três meses, a Mitsubishi veiculou uma campanha publicitária de uma Pajero, destacando o seu motor super silencioso. “Esse carro respeita o silêncio”, assinava o maestro João Carlos Martins em uma mídia indoor exposta no aeroporto de Congonhas.


Nas cidades, as europeias lideram a busca por refúgios de tranquilidade. Desde 2002, a Diretiva de Ruído Ambiental da UE obriga as cidades com mais de 100 mil habitantes a criar e atualizar mapas de ruído, planos de ação e estratégias para proteger “áreas tranquilas” a cada cinco anos. Mas como identificar e oferecer proteção a esse tipo de área ainda é uma questão aberta em nível político na União Europeia, de acordo com a pesquisadora da Universidade Técnica de Berlim, Antonella Radicchi.


Como uma forma de preencher essa lacuna de conhecimento, a também arquiteta e urbanista Antonella lançou em 2017 o aplicativo Hush City, gratuito e colaborativo, que permite a qualquer cidadão de posse de um smartphone medir o nível de decibéis do local em que se encontra e reportá-lo a uma plataforma digital, fornecendo informações adicionais sobre o tipo de sons encontrados.


Na página do Hush City Mobile Lab, do qual a profa. Antonella é a principal pesquisadora, está expresso o pilar filosófico do aplicativo que mapeia os locais onde se possa ter uma refeição tranquila, ler um livro ou simplesmente relaxar: “acreditamos que pessoas como você precisam ser (re) colocadas no centro dos processos de planejamento urbano e engajadas para identificar, avaliar e planejar áreas tranquilas cotidianas nas cidades”.


Ao lado de Fortaleza (CE), São Paulo, que embora não possa ser comparada às cidades europeias, também já possui o seu mapa da ruídos, um primeiro passo importante para dar atenção ao tema. No último dia 28 de setembro sediou ainda uma das caminhadas mundiais para “ouvir a cidade” com o aplicativo, chamada de 1º Hush City Soundwalk (foto no início do post).


A ação foi organizada pela ProAcústica - Associação Brasileira para a Qualidade Acústica em parceria com o Programa Global Hush City Soundwalks, um dos instrumentos de pesquisa sobre a paisagem sonora urbana da profa. Antonella.


Mais uma vez, a tecnologia da informação cumpre o seu papel de estender a mão ao cidadão que busca o bem-estar em uma sociedade complexa. Quem utilizar o aplicativo, certamente, não só ajudará outros usuários a encontrar lugares sonoros aprazíveis na cidade onde se encontra como contribuirá para mudar os olhares sobre o tecido urbano.


Aplicativo Hush City (Android/IOS previamente baixado no celular): http://www.opensourcesoundscapes.org/hush-city/


Mapa de ruído da Cidade de São Paulo: http://www.mapaderuidosp.org.br/


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